sexta-feira, 10 de fevereiro de 2017

Não acredito mais em Deus



Foi o que um jovem me disse numa conversa privada. Nem desenvolveu muito os motivos, mas completou logo em seguida que carregava o crucifixo consigo por tudo o que ele significava em sua história de vida. 

Perguntei desde quando ele havia deixado de crer. Foi acontecendo aos poucos, acelerando a partir do ensino médio, se aprofundando na faculdade de medicina.

Eu também não acredito mais em Deus, digo, no deus da minha infância. Lembro quando desenhava Sua silhueta em cima de nuvens resplandecentes nas folhas de ofício da sala de alfabetização. 

Junto ao Centro Espírita, as evangelizadoras me falavam o que significava onipresença. Então, eu ficava brincando de imaginar um homem múltiplo, um homem em infinitos lugares. Mas, por mais que eu multiplicasse essa presença ao meu infinito, o universo ainda tinha vazios. Seria por onde entraria o mal?

Na adolescência, conheci a metáfora de Kardec: um fluido que abraçava tudo, sem centro de massa concebível. A múltipla presença do homem que imaginara havia coalescido. Era uma coisa só. Mas como entender onde estaria sua atenção? Inconcebível. Como ele pode me ouvir, ouvir a prece de um plutoniano e as preces que ecoam em todas as galáxias, e mesmo até em outros universos possíveis. 

O que mais feria meu raciocínio sobre Deus, todavia, era menos a sua presença, que sempre senti, do que a sua onipotência aliada incondicional de sua bondade infinita. A gente vai crescendo e entendendo o corpo caquético das crianças na miséria. E, cá entre nós, dá um pouco de vergonha dizer que há uma justiça reencarnatória por trás disso. Porque nunca consegui responder o enigma da possibilidade do mal em um universo criado pelo bem infinito. 

Kardec ainda nos propôs ser um viés de uma visão parcial. O conjunto é bom. O mal: uma ausência de bem. Uma ausência de enxergar o que há de bom por trás, também. Contudo, cada vez mais, parece ser outra coisa. O mal: o bem ausente. O mal, quando o bem se ausenta. 

Deus, Aquele que venho conseguindo entender, me parece, perdoem-me a blasfêmia, um Deus de guerra. Ele forja combatentes do bem. Incita-nos a luta contra o mal. Deseja que experienciemos o amor que há no final da batalha, o amor que há durante a batalha, o amor que imperava antes dela. Um Deus de amor, pois e também. O meu amor pelo estudo da história é esse: entender o que houve que destronou o amor onipresente, o que houve no coração humano que permitiu o surgimento do mal. 

Jesus dizia: "nem sempre foi assim". Dizia depois: "foi pela dureza de seus corações". Uma dureza que mostra a fragilidade maior: os nossos corações.


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