segunda-feira, 7 de julho de 2014

Sobre o adultério, as amputações da alma e a retidão das ações

Outrossim, ouvistes que foi dito aos antigos: Não perjurarás, mas cumprirás os teus juramentos ao SENHOR. Eu, porém, vos digo que de maneira nenhuma jureis (…) Seja, porém, o vosso falar: Sim, sim; Não, não; porque o que passa disto é de procedência maligna. (Mt 33-37)


Difícil conectar o imperativo de não jurar com o da retidão da atitude do “sim, sim; não, não”. A melhor aproximação que pudemos fazer é sobre a sabedoria de não vivermos nos excessos, nem de colocarmos em jogo aquilo que nos escapa, o que dá na mesma. Rousseau já dizia que o caminho mais curto para a felicidade é trabalhar o espírito para que o desejo não seja maior que a nossa força. Isso pode nos levar a um estado de apatia, não desejar nada para evitar a fadiga (Lei do Jaiminho do Chaves), ou de voracidade, querendo aumentar nossa força para podermos ter tudo que o desejo pode imaginar (Lei do Capitalismo). O caminho do “não jurar” e do “sim, sim; não, não” parece mais promissor. É, em resumo, abdicar daqueles momentos do espírito em que se diz “eu juro fazer tal ou tal coisa” ou “… ser de tal ou tal jeito” e, no presente momento, nem fazer nem ser. É, de outro modo, tentar estar preparado para o que Deus mandar. Se for a sua hora de fazer e ser, dizer sim para esta hora. Se não for, saber dizer não. Essenciais para essa atitude é saber nosso planejamento reencarnatório, nossas tendências e nossos limites, claro, sem nunca estacionar nestes últimos.  

Portanto, se o teu olho direito te escandalizar, arranca-o e atira-o para longe de ti; pois te é melhor que se perca um dos teus membros do que seja todo o teu corpo lançado no inferno. E, se a tua mão direita te escandalizar, corta-a e atira-a para longe de ti, porque te é melhor que um dos teus membros se perca do que seja todo o teu corpo lançado no inferno. (Mt 5: 29;30)

O amigo que nos guia nos estudos evangélicos nos trouxe uma mensagem de Emmanuel, o mentor do nosso saudoso Chico Xavier, em que ele transformava poeticamente as nossas deficiências em oportunidades benditas de crescimento, isto é, em talentos:


Dividimos, então, nessa noite de estudo do evangelho algumas deficiências físicas que trazíamos conosco. Começamos a tentar enxergá-las não como castigo, mas como convite ao crescimento do Espírito. É o que nos esclarece Emmanuel: o corpo físico é o "templo de formação das nossas asas espirituais para a vida eterna". Eu diria fornalha, mas nesta se fazem espadas. Chega de espadas! O templo íntimo é uma excelente metáfora.



"Aqui é um cego que pediu a medicação da sombra para curar antigos desvarios da visão. Ali, é um surdo que solicitou o silêncio nos ouvidos, como bênção de reajuste da própria alma." (Corrijamos agora)

A sombra e o silêncio é o que, muitas vezes, nós precisamos para refletir melhor sobre o caminho que temos tomado a fim de escolher novos rumos.

Ouvistes que foi dito aos antigos: Não cometerás adultério. Eu, porém, vos digo, que qualquer que atentar numa mulher para a cobiçar, já em seu coração cometeu adultério com ela. (Mt 5:27;28)


Geralmente interpretamos as exortações pelo que elas têm de mais óbvio: seu caráter imperativo. É uma questão de dever, não de amor. Mas, por trás do dever, se quisermos mesmo que o dever triunfe, deve haver amor. Por isso, em certa altura do nosso estudo, deixamos de olhar essa passagem como sendo um ótimo conselho contra o adultério, o de nem pensar nele, e passamos a ver o que conservar-se na fidelidade nos traz de bom. É sair de uma virtude que se mantém por medo do pecado para uma que se constrói por amor a própria virtude.


Ora, ser casal nos tira da eterna evasão do amor. Dom Juan nunca amou, pois, sempre quando se aproximava disso, já estava longe com mais uma aventura no seio de outra mulher. Não é que, em se tornando casal, atinjamos o amor, mas adentramos dentro de uma escola que promete nos ensinar a cada dia essa difícil tarefa: de ser íntimo, cotidiano, sujeito a fracassos, mas ainda assim, surpreender com uma amorosidade que pode nascer de seu contrário, de uma briga, de uma discussão.


Quem nos pode conhecer melhor? Dividimos nossa sombra e o amor as atenua. Se fôssemos em busca de um rapaz ou de uma moça menos sombrios, a experiência de todo mundo mostra que apenas estaríamos trocando de abismo. Basta um toque da intimidade para que as lacunas apareçam.

Ser fiel em um relacionamento, enfim, é aceitar estar matriculado em uma escola bendita de crescimento do eu para além de mim. Sponville, pensando sobre isso, nos diz: "O casal é a civilização mínima - o contrário da guerra, o antídoto da morte. Alain, que foi solteiro durante muito tempo, compreendeu: 'Finalmente, é o casal que salvará o espírito.'"

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