sexta-feira, 5 de janeiro de 2018

O esoterismo da escola do meu filho



Estou tendo acesso a literaturas esotéricas, principalmente porque meu filho estuda em uma escola cujo fundador da proposta, Rudolf Steiner, foi um alemão imerso nestes conhecimentos. 

O que me encanta na pedagogia é muito do que os tempos pós-modernos estão precisando: menos pressão, mais respeito pelo ritmo da criança, mais arte, mais investimento na sensibilidade, no entendimento estético, mais corpo, mais movimento, mão, suor, sujeira. E, particularmente bem evidente nas obras Steiner, o desenvolvimento do olhar místico, ou simbólico se preferir.

Há toda uma corrente filosófica originada do romantismo alemão que aponta ser o entendimento da vida e das pessoas através do sentido estético o futuro da humanidade. Entenda-se futuro não a utopia ingênua, mas o que é necessário ainda acontecer para conseguirmos apaziguar muitos conflitos atuais - presentes.

O filósofo Luc Ferry, bastante influenciado pelo pensamento alemão, havia dito que a grande questão contemporânea sobre a qual a filosofia mais devia se debruçar era o problema do gosto para era democrática, isto é, de como a arte possibilita um entendimento entre as pessoas por caminho diverso ao da razão. Ora, as grandes guerras mostraram que a razão não parece ser um preventivo ideal contra o totalitarismo. A Alemanha e a Itália eram nações muito cultas. Pelo contrário, parece mesmo favorecer: a razão que quer engolfar tudo, dar conta de tudo, saber tudo, entender tudo, subjugar todos à verdade do Partido. Se o gosto tiver o mesmo poder de permitir entendimento entre os diferentes, seria uma força política mais sã? Permitiria o crescimento sem guerra? Essa é a questão!

Já sou bastante herege por ser espírita para criticar quem quer que fuja da norma católica, mas várias questões me inquietam no esoterismo steineano: 

1. A falta de um método claro que permita o compartilhamento, e portanto a crítica, universal da verdade que se prega

Steiner quis ultrapassar isso tentando iniciar as pessoas em sua forma de ver o mundo, ou melhor, os mundos superiores. E em algumas palestras ele é bem duro com os interlocutores dizendo, por exemplo, que se a pessoa não teve o resultado esperado segundo o que pregava sua "dica" é porque ela não fez direito. 

Vá lá que esse é o mesmo argumento que meus professores de medicina carrascos davam aos alunos que não chegavam a um certo resultado dentro do laboratório. Mas, não é do totalitarismo que estamos querendo escapar? Para que Auschwitz não se repita...

O espiritismo diz que esta visão dos mundo superiores não se alcança por esforço. É uma possibilidade dada por Deus em certa encarnação, a que poderíamos chamar de dom. Não seria Steiner portador de tal dom e queria ele que todos o fossem forçosamente? Kardec achava que tal esforço só poderia originar produtos da imaginação. Daí outro ponto...

2. O exagero de revelações

O espiritismo já havia provocado uma ruptura com a tradição católica que rezava ser apenas, e unicamente, através da aceitação de Cristo, com a consequente e necessária adesão à sua igreja apostólica romana, o caminho da salvação. O espiritismo vinha dizer que não, que era a caridade. 

No fundo, olhando a argumentação toda de Kardec, significava dizer que a pessoa que verdadeiramente abraçou a Cristo mostrava o distintivo desta adesão com o esforço de abertura ao próximo. 

O que as igrejas cristãs oficiais pregam, devemos buscar entender, é que nenhuma obra substitui a aceitação amorosa da figura de Cristo. Essa aceitação é condição sine qua non de todo o resto. 

Steiner faz as vezes de aceitar o Cristo como centro de sua teoria esotérica ou teosófica, ou ainda, antroposófica, mas insere um conjunto de elementos estranhos aos discursos oficiais que, creio eu, perturbam mais do que esclarecem. 

Outras incursões, todavia, são muito bem-vindas, por exemplo, a de reconhecer a vida humana como impulsionada por uma força crística, e a história da humanidade, pelo mistério do Gólgota. Sem pudor vai estabelecendo parâmetros para mostrar o que seria o comportamento saudável tanto da encarnação do espírito no corpo, como do progressivo domínio deste por aquele. São voos que nem Kardec nem os Espíritos através de Chico Xavier decidiram dar tão altos. É que, defendia o codificador na sua sensatez, perde-se o ar em zonas tão rarefeitas das esferas das revelações, e as figuras poéticas tomam o lugar da precisão.

3. É possível acessar conhecimentos dos mundos superiores e tê-los disponível ao intelecto encarnado de forma clara?

Steiner fala da "piscina" Akáshica, que seria um todo de conhecimentos bem vivos do mundo espiritual ao qual poderíamos ter acesso em êxtase místico. 

Os seguidores da antroposofia advogam que Steiner conseguiu ter fôlego para entrar lá e trazer a coisa bem clara. Por que ele e não João, e não Daniel, para citar autores apocalípticos que trouxeram revelações akáshicas milenarmente guardadas? 

O que quero dizer é que a literatura apocalípitca, que mais akáshica não poderia ser, está toda encarnada em um simbolismo profundo que desafia as maiores mentes exegéticas e provoca dissensões escolares. Steiner seria o iluminado supremo que teria ultrapassado a capacidade dos autores apocalípticos de expressarem coisas transcendentes para as mentes imanentes na carne? Sem desprezar a grandeza do homem, acho mais sensato pensar que este grande especialista de Goethe trouxe de lá outras tantas imagens que, ao se encarnarem na linguagem humana, viraram símbolos de portentoso valor. É o mesmo que acredito acontecer com outros tantos romances de Chico Xavier. Tomamos eles ao pé-da-letra para melhor lê-los, mas não os deveríamos levar a ferro e fogo, senão extrair a essência das lições morais que permeiam aquelas cenas.

 

Por fim...

Queria pontuar, que, apesar destas considerações, a ciência espiritual de Steiner é muitíssimo intrigante. Uma mente prolífica que saiu espalhando milhares de conferências sobre os mais variados assuntos em um mundo entreguerras, semeando verdades inquietantes nos mais diversos terrenos (medicina e terapias diversas, arquitetura, agricultura, religião, pedagogia, dança, pintura, política), e que frutificaram angariando adeptos fervorosos. 

Assim como Chico Xavier, renegado pela ciência oficial, este é outro médium que precisamos estudar com calma. 


Fonte da Imagem: https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Rudolf-Steiner-1907.jpg

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