Continuando a explicar a civilização grega no que tange sua mentalidade e o espírito do povo, elegia como a missão de hoje entrar no mérito da polis. Como explicar a virtude política que animava o espírito grego sem ser enfadonho? Tive a ideia de uma dinâmica!
Nível 1: As pessoas se movimentariam aleatoriamente no salão e eu, munido com uma bolinha de plástico, atiraria nelas. Em quem a pessoa pegasse morreria.
Cena 1: Um senhor tomou a mocinha que passava na sua frente e colocou-a como escudo a fim de se proteger da bolinha mortal.
Nível 2: Se a pessoa conseguisse agarrar a bola com a mão sobreviveria.
Cena 2: Uma moça tentou pegar a bola que não era direcionada para ela a fim de salvar o companheiro que andava ao lado.
Nível 3: Palavra de ordem: "Escolham pessoas que você gostaria de proteger. Esta é sua família. Desta família escolham um para ser herói. O herói será imune à bola. Não morrerá se for tocado por ela."
Cena 3: Cada herói tentou defender a sua família. Tínhamos, ao todo, cerca de cinco heróis. Em nenhum momento falei que não poderiam se unir. Aliás, desde o começo não mencionei que ninguém poderia se ajudar, formar alianças, engendrar estratégias. Pelo contrário, deixei bem claro: "Vocês fazem parte de uma mesma civilização, a dos gregos. Estamos em guerra e sou seu inimigo." Eu, sozinho, derrotei, ao final, toda a civilização grega, malgrado o esforço dos heróis que, separadamente, cada um a sua maneira, tentavam salvar suas famílias e apenas suas famílias.
Uma heroína depois revelou que teve vontade de unir forças com outros heróis, mas desistiu da ideia.
Pois bem, ninguém teve sentimento de polis. A polis era isso. Somos muitos (poli). Mas somos um (polis). Eu sou minha polis. Minha identidade está nela. O pior castigo que alguém poderia sofrer era ser expulso da polis (ostracismo). Era pior do que a morte. Ajudar a polis a crescer, seja participando das deliberações, seja cultivando sua terra e gerando filhos, era o ideal de uma vida cidadã bem sucedida.
Essa é a chave de compreensão para o motivo de o lendário herói Odisseu ter rejeitado a sedutora proposta da imortalidade regada a amores da ninfa Calips. Pois a felicidade para ele era retornar ao seu reinado, onde envelheceria junto a Penélope, a rainha, e Telêmaco, seu filho, e morreria. Seu lugar era na polis!
Da mesma forma vamos compreender a fala de Aquiles, ao ser encontrado no mundo das sombras, onde vagam os fantasmas dos que viveram: "Não elogie a morte, Odisseu. Antes vivo, ainda que escravo." Pois estaria vivendo na polis.
Por fim, Sólon, um dos sete sábios da Grécia, é questionado pelo poderoso rei Creso sobre quem seria o mais venturoso homem do mundo. Resposta improvável para Creso: "Telo de Atenas". Este era um senhor que gerou filhos e viu os netos crescerem. Já tendo a riqueza do suficiente, entrega-se a uma batalha para proteger Atenas, morre nela, e é velado com grande honra pelos seus. Qual a virtude de Telos? A vida na polis, pela polis.
Foi o que quase ninguém, ao salão, teve na dinâmica. Cada um querendo se salvar, ninguém teve a virtude política de agir por todos, buscando a todos salvar, a quem fosse possível, estratégias de união em punho. Imagino que se, ao final, os heróis tivessem se postado como na figura que coloquei no começo deste texto, representando a formação de guerra dos hopilitas, soldados gregos, ninguém teria se ferido. Virtude política!
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As reflexões que se seguiram falaram sobre o quanto de fato sentimos falta da nossa polis. O quanto nossas raízes são importantes, nos definem. O quanto, portanto, deveríamos dedicarmo-nos uns aos outros, proteger-nos. O quanto não fazer isso nos enfraquece, nos deixa pobres.
É uma mensagem que, tranquilamente, poderíamos tirar das sabedorias judaico-cristãs, embora com fundamentos diferentes. Segundo o livro "A caminho da Luz", de Emmanuel, que estamos estudando, essa admirável concordância sobre virtudes entre diferentes povos não tem nada a surpreender, já que mostra apenas as mensagens que Jesus espalha para fazer florescer os homens na grandeza de cada civilização. O motivo da derrocada de cada povo é a invigilância para com estas virtudes. Foi o que aconteceu com a Grécia ao matar Sócrates, um dos homens mais virtuosamente políticos que já tiveram. Um assassinato que demonstrava a decrepitude da percepção sobre seus valores.