terça-feira, 30 de julho de 2013

Influência dos bons Espíritos




O objetivo da palestra era ultrapassar um pouco a imagem que temos de que influência espiritual é só uma questão de anjinho versus diabinho no ouvido. Há vários caminhos para engrandecer essa reflexão, por exemplo, esclarecendo as influências que nós, Espíritos encarnados, exercemos uns sobre os outros. Todavia, focarei nesse post o caminho de retirar o pessimismo das influências satânicas, alargar o horizonte da vida espiritual com a população invisível que compartilha espaços semelhantes do cotidiano e, por fim, deixar uma mensagem de otimismo sobre a dedicada missão de nossos (de todos nós!) anjos guardiões.  

Comecei, então, tentando destruir a ideia de Satanás na cabeça do público. Como o Espiritismo faz isso? 

Não nos valemos de um arcanjo poderoso para, com uma espada incandescente, matar o anjo decaído. Simplesmente, submetemos o Diabo às leis da natureza e o fazemos reencarnar. Em condições tais que ele não poderá ter poder na vida, devendo elevar seu Espírito com as dores da humana condição terrena e cultivando as virtudes com o suor do rosto. Para conduzir essa educação é mister pai e mãe exemplares que aceitem essa missão com sincero amor ao próprio filho e à Deus. Pronto! Nenhuma violência foi necessária, a não ser a de submeter compulsoriamente um Espírito obstinado no mal ao manto de sangue, ao arcabouço de ossos, às vestes de carne e às lágrimas de um coração que já pode ter piedade. 

A segunda parte é a descrição de um mundo repleto de habitantes para além dos nossos olhos. Seriam eles mais neutros que bons ou maus. Perambulam pelas ruas, assistem aos cinemas e aos teatros, se valem de ônibus para se transportar, porque completamente ignorantes da própria condição de imortalidade e, ainda pior, do sentido de toda essa vida errante. Visitam parentes, amigos, pessoas caras. Dialogam com elas através do pensamento. Rejeitam a ajuda de pessoas estranhas, mas cândidas, que lhes querem resgatar dessa vida alienada. Quase conseguimos enxergar todos os habitantes da Terra nessa situação. De fato, é mais ou menos assim, a morte não nos muda, só nos atrapalha por um instante, depois retomamos uma forma de viver que nos era muito peculiar. A espiritualidade nos faz enxergar o sentido das coisas, o rumo dos passos. Todavia, sem ela, sem direção. Ficamos a mercê dos atos ordinários de cada dia. 

Na terceira, tentei evidenciar nossa condição de “interexistentes”, como frisava o prof. Herculano Pires. Somos como que navegantes em um barco a deriva, ora fixando no leme e na rota do barco, ora em todo o oceano e sua beleza, no horizonte e sua imensidão, nos pássaros e sua liberdade. O barco e o leme são o corpo, a rota, essa vida, as outras coisas são tudo o mais que transcende isso aqui. Por menos médiuns que sejamos, somo mais médiuns do que imaginamos. Os momentos de ausência e fuga são a percepção da presença de tudo o que escapa aos nossos costumeiros sentidos e o mergulho em todo esse universo que nos embala para além da matéria. Não podemos nos esquecer que a carne é porosa, e isso diz tudo sobre a mediunidade de todos nós.

Temos, até agora, um mundo sem anjos perpetuamente devotados ao mal, com milhares de Espíritos nem bons nem maus ao nosso redor e um corpo esponjoso que está receptível às mais variadas influências. É nesse cenário que introduzo a teoria dos Anjos Guardiões a que Kardec dedica trinta e três itens de O Livro dos Espíritos:

“É uma doutrina, esta, dos anjos guardiães, que, pelo seu encanto e doçura, deverá converter os mais incrédulos. Não vos parece grandemente consoladora a ideia de terdes sempre junto de vós seres que vos são superiores, prontos sempre a vos aconselhar e amparar, a vos ajudar na ascensão da abrupta montanha do bem; mais sinceros e dedicados amigos do que todos os que mais intimamente se vos liguem na Terra? Eles se acham ao vosso lado por ordem de Deus. Foi Deus quem aí os colocou e, aí permanecendo por amor de Deus, desempenham bela, porém penosa missão. Sim, onde quer que estejais, estarão convosco. Nem nos cárceres, nem nos hospitais, nem nos lugares de devassidão, nem na solidão, estais separados desses amigos a quem não podeis ver, mas cujo brando influxo vossa alma sente, ao mesmo tempo que lhes ouve os ponderados conselhos.” (L.E. 495)

Há, depois, uma pergunta intrigante sobre a necessidade de se ter sempre um protetor. O Espírito responde que, quando a pessoa atinge certo nível de maturidade espiritual, a tal ponto de poder “guiar-se a si mesmo”, o “momento chega em que não mais precisa de mestre”. Acrescenta, contudo, que isso não se dá na Terra. Mas, já presenciamos um Espírito nesse estágio...

Era Jesus. Diz-nos Emmanuel que os planetas por onde esse Espírito cresceu, seus sóis já se esfacelaram no espaço. Não mais sendo possível o seu tropeço, segue senhor de si, o que significa completamente em harmonia com a Vontade do Senhor das Estrelas. Veja, portanto, que não é possível deixar de receber influência de alguém. O almejado é que essa influência seja a todo tempo ainda mais nobre, a tal ponto de chegarmos a entender Deus. Poder-se-ia dizer que se a vontade do filho é igual a Vontade do Pai, não há mais influência, senão trabalho em conjunto. Que seja! Os jogos de palavras importam menos que a beleza desse fim. 

segunda-feira, 29 de julho de 2013

Desigualdades e Conflitos sociais




Com este texto inauguro uma sessão que deixará arquivados os eixos condutores de minhas palestras que aqui e acolá ouso proferir em alguns centros espíritas desta cidade.

O desafio era atualizar o público quanto ao que estava acontecendo no Brasil, numa visão espírita, óbvio. Então, me sopraram aos ouvidos a metáfora da Torre de Babel. Veja bem que considero uma metáfora e não uma realidade tal qual “A Palavra” diz.  E ela diz assim: 

“E era toda a terra de uma mesma língua e de uma mesma fala. (...) Eia, façamos tijolos e queimemo-los bem. E foi-lhes o tijolo por pedra, e o betume por cal. E disseram: Eia, edifiquemos nós uma cidade e uma torre cujo cume toque nos céus, e façamo-nos um nome, para que não sejamos espalhados pela face de toda a terra. Então, desceu o SENHOR para ver a cidade e a torre que os filhos dos homens edificavam; e o SENHOR disse: Eis que o povo é um, e todos têm a mesma língua; e isto é o que começam a fazer; e agora, não haverá restrição para tudo o que eles intentarem fazer. Eia, desçamos e confundamos ali a sua língua, para que não entenda um a língua do outro. Assim, o SENHOR os espalhou dali sobre a face de toda a terra; e cessaram de edificar a cidade.” (Gênese 11: 1-8)

Um povo que fala uma só língua. Parece ser esse povo o que descende de uma linhagem específica dos homens, a adâmica. Essa história é uma sequência que se desenrola imediatamente após a descrição de uma árvore genealógica, cujo tronco é Noé, o que sobreviveu ao dilúvio. O Espiritismo defende que a “raça adâmica” é apenas mais uma das muitas culturas que havia na Terra. A Bíblia conta a história dela, de sua miscegenação, disseminação e busca pela salvação. 

Um nome para que não sejamos espalhados pela face de toda a terra.  É a língua uma das ferramentas que nos faz reconhecer os irmãos. Se identificados sob o mesmo nome, ainda melhor. Para os hebreus, a palavra tem ainda mais significado. E, verdadeiramente, parece que na história da humanidade houve uma melhor agregação dos indivíduos após o desenvolvimento da linguagem. 

Uma torre cujo cume toque nos céus. Todo um povo unido para construir uma torre que os eleve até o céu nos faz lembrar muito o projeto humano rumo à trascendência, seja sob que aspecto ela se apresentar, isto é, Deus, céus, Reino dos Céus, perfeição. Pensar uma história que cresça rumo ao melhor, lutar por uma história que parteje um mundo mais justo, menos desigual, é trabalhar em uma torre que finde no céu. 

Até aí, tudo bem. Não há nada de mau ser um povo unificado por uma língua que se dedique a alcançar o céu através da construção coletiva de uma torre. Por que o SENHOR decidiu acabar com essa festa? Porque não haveria restrição para tudo o que eles intentarem fazer. Aqui coincide com a mitologia grega dos homens de ferro que receberam do titã Prometeu o fogo olímpico para, por exemplo, "queimar os tijolos", mas que poderia incendiar toda a Terra. Os homens com todo o poder e sem normas que os limitassem (“não haverá restrição”) tinham nas mãos a possibilidade da desordem. Zeus, em sua mitologia, espalha males e a esperança, para que os homens fiquem insaciáveis em busca da reconciliação com o cosmos. Iavé, espalha os homens, pra quê?

Em analogia com a mitologia grega, o espalhar dos homens pode ter um significado salvífico ou de sabedoria, qual seja, retomar mais adiante a construção da torre, após ter se reconciliado com os homens de toda a Terra. Ou melhor, essa é a única torre que nos levará aos céus:  aquela construída sobre a reconciliação dos irmãos. Pelo menos no Espiritismo, a reconciliação com os homens - o amor ao próximo - nos faz assumir a identidade de filhos de Deus, voltando a falar a língua única que nos torna um com o Pai. O céu é uma aquisição consciencial, a torre é a nossa história. 


  • Esclarecimentos para além da Bíblia


A história acima nos serve para encontrar um sentido muito especial para os conflitos humanos, mas sua gênese fica a desejar, pelo menos para mim que não sou especialista em texto hebraico. Cabe deixar claro o que para o Espiritismo é válido.

Os conflitos, em certa medida, vêm das desigualdades, que, por sua vez, originam-se da liberdade dos homens em querer ser maior do que os outros. 

No início, pode parecer uma luta egoísta de dominação e competição, e de fato o é. Mas, o tempo mostra que a solidariedade é mais útil que a luta entre irmãos. E tanto mais útil quanto mais universal. 

Os conflitos sempre aparecem nas grandes transições de consciência. É como a ruptura de um corpo de ideias que já não servem mais ao crescimento do Espírito. 

Embora seja duvidoso que conseguiremos retomar alguma igualdade essencial, o prêmio ao final da jornada será o mesmo para todos os vitoriosos: a felicidade eterna ao lado do Pai. Com um detalhe, o Pai quer que todos sejam vitoriosos, e trabalha constantemente para que assim seja. E será!

sábado, 20 de julho de 2013

As potestades de Deus




Alguns posts atrás esbocei uma posição política a favor de uma “teologia democrática” que se caracterizava pela manifestação de Deus “por todos os seus filhos”. Encontrava-me incendiário à época. O Brasil ainda pega fogo, mas já posso pensar com frieza. 

Em quem e em que Deus se manifesta? É a pergunta.

A rigor, em tudo e em todos. É a resposta primeira. Segue a sequência das interrogações:


  • Se Deus é todo perfeição em bondade, beleza e sabedoria, por que discrepância entre os humanos manifestantes?
- Para deixar a divindade se expressar em nós em toda a sua potência, necessário é suportarmos essa manifestação.


  • Como fazer para suportar a manifestação divina?
- Desenvolver ao máximo (até a perfeição) a bondade, a beleza e a sabedoria.

É o que Aristóteles chamava de levar a potência ao ato. Atualizar o que em nós é potência. 

Kardec era favorável a um tipo de governo muito particular: a aristocracia intelecto-moral. Críticas caem sobre ele a partir dos republicanos que vêem nessa ideologia um retorno ao absolutismo. Mas, enganam-se. Não é da ordem do sangue essa aristocracia, é da ordem do espírito. Tão pouco é por ocasião de uma escolha gratuita e, portanto, imposta a assunção do poder, é por mérito. Exerce um império natural aqueles que se elevarem intelecto-moralmente a tal ponto de fazer valer a divindade em si. 


  • O que difere da aristocracia dos dons, os chamados bem dotados?
- Todos, sem exceção, possuem dons de Deus. Não há escolhidos. Todavia, estão em potência. Depende de si a atualização desses dons. A vontade própria os desenvolve em maior ou menor velocidade. 

Acontece de o poder ser distribuído aos inaptos, de forma mais comum do que gostaríamos. É um estímulo para desenvolver suas aptidões. De modo bem diverso, os aptos exercem uma liderança tão espontânea e humilde que os povos deixam-se guiar por suas estratégias quase sem consciência. 

Ao arrastamento inconsciente dos povos nos mandatos dos inaptos dá-se o nome de alienação atrelado quase todo tempo à exploração. Uma inconsciência forçada por manipulação ideológica, por silenciamento das críticas. Ao fluxo, também inconsciente, o que nos leva a dizer também "natural", conduzido pelos aptos é o que entendo por trabalho, constantemente associado à evolução. Uma inconsciência que entra em harmonia com as aspirações mais íntimas de melhoramento da humanidade.  Aquele torna o homem um escravo, este o torna digno. Aquele, uma coisa, este, um deus. Reificação e divinização. 

Sobre nós há a condução silenciosa de um conjunto de Espíritos luminares que, em última instância, revertem qualquer mal momentâneo em bem eterno. Seremos, um dia, dessa categoria de Espíritos. Cabe a nós se aproveitar desses estágios conflituosos nos cueiros do Universo da melhor forma possível.