Senti vontade de apresentar o espiritismo através de minha biografia. Como que para que entendam o que ele é como comunidade propícia para uma criança crescer.
Todos os domingos era sagrado papai nos levar ao centro espírita. Nele, eu e minha irmã éramos entregues a evangelizadoras que nos ensinavam o bom proceder na vida com vistas a agradar a Deus.
As temáticas cristãs, da herança judaica aos milagres do Cristo, eram naturalmente misturadas com as particularidades que só vieram modernamente com o espiritismo: mediunidade e reencarnação.
Desde pequeno me era óbvio: Deus é supremo, Jesus seu filho mais querido que olha por nós, sobrevivemos à morte, podemos nos comunicar com os falecidos, a qualquer momento eles podem voltar em um processo que denominamos de reencarnação.
Eu não sabia o quanto aqueles conceitos eram polêmicos. Mais na frente apenas me ria de colegas da escola não saberem o que eu sabia. Sentia-me um privilegiado.
Porque não tive infância difícil, coberto de facilidades, maltratado apenas por uma asma que nas chuvas me apertava o peito, levando-me ao hospital de madrugada, não dei para questionar as atitudes divinas. Não coloquei em confronto a bondade, o poder e a justiça de Deus com a maldade, os desmandos e as iniquidades do mundo. Era bem óbvio, pela reencarnação, que tudo o que de mal havia no mundo vinha das más escolhas do homem, e que apenas ele poderia se redimir. Raciocínio matemático: meu quarto está desarrumado porque eu não o arrumei.
Não fui um garoto piedoso. Buscava mais os elogios. Se a caridade era festejada, deveria procurar exercê-la. Diziam-me as evangelizadoras que assim o fazíamos quando éramos gentis, obedientes aos pais, cuidadosos com os irmãos, respeitosos com os mais velhos. Quando fazíamos as lições, estudávamos e éramos bons alunos. Arrumávamos o quarto, não cometíamos peraltices. Não mentir, não roubar, não falar mal do colega. Eis o caminho para o céu.
De todas essas práticas de ascese, a mais difícil, de longe, era ser cuidadoso com o irmão, no caso, a irmã. Eu não suportava a minha. Brigávamos por qualquer coisa. Ela instigava, eu revidava. Chegávamos a nos espancar. Uma vez a empurrei ao ponto de a queda abrir uma ferida em sua cabeça. De outra vez, ela encostou o ferro quente em meu peito. Os cabelos dela vez ou outra restavam em minhas mãos. Certo dia, ela fechou o portão no meu dedo, que quase é decepado fora. Na maior parte do tempo, era uma animosidade latente. Quando culminava nesses excessos, um sentimento de culpa e desespero me invadia, talvez menos por misericórdia do sofrimento dela, do que pelo medo da punição materna. À época ainda não se havia instituído a lei anti-palmada.
À noite, antes de dormir, mamãe nos ensinava o Pai Nosso e a Ave Maria. Por algum tempo, o verso "Santa Maria mãe de Deus" não me incomodou. Apenas depois é que fui me perguntar como Deus, que é a origem de tudo, pode ter uma mãe. Com a ajuda do colégio católico em que fomos alfabetizados, em pouco tempo decorei estas orações. Serviam, dizia-nos, para nos proteger a noite dos monstros. Então, era menos os significados que elas carregavam, mas sim o poder mágico que elas tinham que importava. Muito cedo, dei para não dar valor a orações decoradas e passar a fazer uma que viesse das minhas próprias palavras, acho que instado pelas tias da evangelização domingueira.
Quando me ensinaram a respeito da vida livre do Espírito durante o sono, que neste período nos desgarrávamos e poderíamos ir aonde quiséssemos, a prece antes de dormir passou a ter o objetivo de chamar o anjo da guarda para que me conduzisse aos lugares mais alegres e bonitos.
Disse que não fui um garoto piedoso, e que a infância foi repleta de facilidades. E se eu tivesse nascido entre pais que se odeiam, numa vizinhança conturbada, com a fome a me ferir os nervos e o frio castigando a pele? Quando eu rezasse para o Pai-de-todos e os berros continuassem, os tiros cortassem o céu, o alimento deste não descesse e o cobertor não caísse, que força teria tido meu coração infantil de sustentar o amor a Deus? Até que ponto a reencarnação de justificativa lógica para os males não passaria para um peso de culpa: o que fiz para merecer isso. Ingredientes explosivos para a revolta, que não aconteceu.
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