terça-feira, 11 de junho de 2013

Nem em cima nem embaixo, dentro



Demônio vem do grego, daimon, que era a palavra para designar tão somente espírito ou gênio. Neutra por si só, era a ela concedida o adjetivo de bom ou mau. Há uma passagem eloqüente sobre esse assunto na Apologia de Sócrates:
"Aquela minha voz habitual do demônio [daimon], em todos os tempos passados, me era sempre freqüente, e se opunha ainda nos mais pequeninos casos, cada vez que fosse para fazer alguma coisa que não estivesse muito bem." 
Há quem diga que esse gênio tagarela ao ouvido de Sócrates era uma voz íntima, o que não refuta a tese espírita de que era um Espírito, pois estes transmitem seu pensamento como sendo uma voz penetrante chegando à alma, mas tem o mérito de tirar as cores vermelhas de contornos pontiagudos que colocaram sobre a palavra na teologia cristã oficial. 

A Igreja enxerga a mediunidade como fenestra para as peripécias do diabo.  Todavia, novamente do grego, diabo vem de diabolos, que é aquilo que distorce significados ao invés de os congregar, que seria a função do símbolo. Numa concepção teológica, é o que afasta a criatura de Deus.   

Uma discussão antiga, mas trazida à tona na contemporaneidade por um certo teólogo alemão Eugen Drewermann, sugere que a mensagem do Cristo poderia ser mais metáforas que fatos. O que nos parece óbvio é de uma ruptura aterradora para a mentalidade cristã ortodoxa. É dizer que o Céu pode estar dentro de você competindo o espaço com o Inferno. Não é uma voz que lhe chega ao íntimo, é a sua intimidade que ganha voz

Por mais reformas e movimentos de resgate que a Igreja tenha feito, essa nova ideia que ressalta os simbolismos das mensagens vem ganhando muito mais terreno no nosso pensamento ocidental do que a realidade objetiva das palavras de Jesus sobre o Reino dos Céus ou o Fogo do Inferno. 

Então, antes de falar qualquer coisa sobre o demônio, é meu intuito aqui deixar bem claro um dos princípios mais revolucionários do Espiritismo, pedra angular de muitos outros princípios. O que Drewermann sugeria já tínhamos, desde o nascimento da doutrina, como ponto pacífico. Passo a fala para Kardec subindo ao palco de O Livro dos Espíritos: “trazemos em nós mesmos o nosso inferno e o nosso paraíso” (Comentário a Resposta 1017). 

Ou, no dizer de Emmanuel, à introdução de Nosso Lar: “a maior surpresa da morte carnal é a de nos colocar face a face com a própria consciência, onde edificamos o céu, estacionamos no purgatório ou nos precipitamos no abismo infernal.”

Nas próximas postagens, vou me ater mais a figura do demônio e ao amor que se deve ter para com o Inimigo. 

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